GRAVAÇÃO DE ÁUDIO PELA UBER E A AÇÃO DE PRODUÇÃO ANTECIPADA DA PROVA NO CPC 2015

  • 13/02/2020
  • Direito Processual Civil
  • Bruno Augusto Sampaio Fuga

Esta semana a Uber divulgou em notícia nova ferramenta, que permite aos usuários e motoristas gravar áudios durante corridas, mas serão eles criptografados. Assim, imaginemos a seguinte situação. O passageiro deseja ter acesso ao áudio, que é criptografado, mas a Uber recusa. Como proceder diante da negativa de entrega voluntária?  

A solução jurídica, de acordo com meu entendimento, tem fina ligação com a ação de Produção Antecipada da Prova, prevista no CPC/2015.

Primeiro, entendo necessário (mas não obrigatório) que a parte tente obter a gravação extrajudicialmente, mediante notificação, contato pelos canais de comunicação e afins, com registro para fins de comprovação de tentativa amigável. Não sendo fornecida a gravação, entendo cabível o ajuizamento de Ação de Produção Antecipada da Prova, com fundamento no art. 381 do CPC. Veja os fundamentos legais:

Art. 381. A produção antecipada da prova será admitida nos casos em que:

I - haja fundado receio de que venha a tornar-se impossível ou muito difícil a verificação de certos fatos na pendência da ação;

II - a prova a ser produzida seja suscetível de viabilizar a autocomposição ou outro meio adequado de solução de conflito;

III - o prévio conhecimento dos fatos possa justificar ou evitar o ajuizamento de ação.

Os três incisos estabelecem hipóteses de cabimento da referida ação. O primeiro deles é em situação de urgência, quando haja possibilidade de tornar-se impossível ou excessivamente dificultosa a obtenção da prova no curso da ação. A segunda hipótese se verifica quando a produção da prova possa viabilizar o acordo, em uma futura ação de danos morais, por exemplo, a gravação evidentemente poderia comprovar ofensa do motorista e a empresa certamente poderá fazer proposta de acordo a fim de solução do litígio. Assim, o inciso II apresenta uma possibilidade de fundamento para pedir a gravação. Por fim, no inciso III, o fundamento poderá ser ter conhecimento do áudio para justificar ou evitar o ajuizamento da ação, ou seja, a parte poderá ter acesso ao áudio e verificar que o fato realmente justifica o ajuizamento da ação ou, em melhor análise da gravação, entender pelo não cabimento, fato que evitaria o ajuizamento.

A ação não analisará o mérito de eventual pretensão indenizatória, contudo poderá analisar o mérito do direito de solicitar o áudio. A título de exemplo, se alguém que não é o passageiro e não tenha poderes para solicitar o áudio ingresse com ação pedindo a gravação, poderá ser realizada análise de mérito quanto à legitimidade de solicitação da prova. A empresa Uber certamente poderá recusar a entrega da gravação e, nessa hipótese, a Produção Antecipada de Provas deverá ser improcedente. Mas, sendo a recusa infundada, a empresa deverá ser condenada a apresentar o áudio, inclusive sob pena de multa diária.

Reafirmo ser importante a notificação para apresentar a gravação extrajudicialmente, pois havendo recusa da empresa e sendo necessário o ajuizamento da ação, entendo ser cabível, neste ponto, a condenação aos ônus de sucumbência (custas e honorários), pelo princípio da causalidade.

Outras discussões poderiam ser levantadas, como possibilidade de recurso, intervenção de terceiros, necessidade de sentença, possibilidade de a ação ser ajuizada no juizado especial, dentre outros temas. São assuntos interessante e já discorridos no livro Provas no CPC e Produção Antecipada da Prova (com organizador), disponível pela Editora Thoth – www.editorathoht.com.br

Bruno Augusto Sampaio Fuga

Advogado e Professor. Doutor em Processo Civil pela PUC/SP. Mestre em Direito pela UEL (na linha de Processo Civil). Pós-Graduado em Processo Civil (IDCC). Pós-Graduado em Filosofia Política e Jurídica (UEL). Membro da academia londrinense de letras (cadeira n.º 32). Conselheiro da OAB de Londrina. Membro ABDPro, IBDP e IDPA. E-mail: brunofuga@brunofuga.adv.br