Quanto custa acreditar em audiências de conciliação
Qual é o valor despendido pelo Judiciário com as audiências obrigatórias de conciliação nos Juizados Especiais? Mais especificamente: qual o percentual de aproveitamento dessas audiências em relação ao total investido?
Minha pergunta — embora eu já conheça a resposta — é: o Judiciário administra bem os aspectos financeiros de seus gastos? Penso que não. E, adiante, fundamentarei essa percepção.
Um exemplo emblemático: positivamos uma audiência quase obrigatória por meio do artigo 334 do Código de Processo Civil. Assim, sob o pretexto de implementar uma política de conciliação — quase uma ideologia da cultura conciliatória —, tornou-se obrigatória a audiência inicial, salvo as exceções previstas no § 4º do referido artigo.
Diante disso, ao institucionalizarmos essas audiências, qual seria o custo efetivo para o Judiciário? Considerando que grande parte das demandas possui natureza repetitiva — promovidas por grandes litigantes que as utilizam como instrumento de protelação, sem qualquer interesse real em compor —, é válido tornar obrigatória a audiência de forma generalizada, sem análise prévia de pertinência e expectativa de êxito?
Com base em dados objetivos: no TJ-PR, o salário base de um conciliador é de R$ 7.082,99. Somando os Cejuscs e os Juizados Especiais, há 961 servidores. Pergunto: essa destinação de recursos tem resultado proporcional?
Presenciei, reiteradas vezes, longos períodos de espera nos Juizados Especiais, com audiências envolvendo operadoras de telefonia, seguradoras e planos de saúde. Em quase 100% dos casos, não houve proposta de acordo: a audiência se resumiu a uma formalidade legal. Muitos advogados, inclusive, as classificam como perda de tempo.
Mas minha inquietação vai além: há controle sobre o custo dessa ideologia de promover audiências em processos com baixíssima perspectiva de acordo?
Spacca
Esclareço: não sou contrário às audiências de conciliação. Ao contrário, defendo que esse esforço — intelectual e financeiro — seja canalizado para processos que efetivamente apresentem viabilidade conciliatória, como ações de família, demandas indenizatórias, entre outras.
Talvez o Judiciário esteja administrando muito mal o seu orçamento.
Cito um exemplo paralelo dessa ausência de controle: ações ajuizadas em massa em razão de falhas do INSS — erros periciais, atrasos na análise de pedidos, decisões administrativas equivocadas. E onde essas ações tramitam? Na Justiça Federal, possivelmente o ramo mais oneroso do Judiciário, considerando-se servidores, estrutura física etc. Não por acaso, criou-se ali o “Balcão de Atendimento Previdenciário dos Juizados Especiais Federais”.
Vejamos: o problema persiste no órgão de origem, mas a lide é transferida para o Judiciário Federal — justamente o mais caro. Onde está a racionalidade nesse modelo de alocação de recursos públicos?
Como professor convidado do mestrado da UEL, ouvi de um promotor o seguinte relato: numa pequena comarca, a pauta de audiências de instrução em casos de violência doméstica apresentava espera de três anos — prazo, aliás, correspondente à prescrição de delitos menos graves.
É estarrecedor: convivemos com distorções orçamentárias grotescas. Aceitamos passivamente o argumento de “falta de estrutura” para justificar três anos de espera em casos de violência doméstica — mas convivemos tranquilamente com gastos quase inúteis em outras frentes.
O erro do Legislativo
O Judiciário precisa gerenciar melhor seu orçamento, com critérios objetivos e foco prático. Não é razoável alegar carência estrutural para justificar morosidade em processos urgentes, ao mesmo tempo em que se desperdiçam recursos em frentes ineficientes.
Sendo direto — e, talvez, polêmico: um desejo cego e impraticável por uma cultura conciliatória generalizada é prejudicial ao Judiciário. Foi assim que agiu o Legislativo, que positivou o tema sem considerar seus custos e seu possível aproveitamento. Melhor seria concentrar esforços e recursos em processos com real possibilidade de composição. Nos demais, em que há baixa perspectiva de acordo, que se dispense a audiência, conforme faculta o artigo 139, inciso VI, do CPC.
Mas é importante compreender que a dispensa da audiência (artigo 139, VI, do CPC), embora possível, não atinge o ponto central do presente artigo: o erro do Legislativo em positivar o tema sem considerar — reafirma-se — as perspectivas práticas dos custos envolvidos.
Assim, nos processos com viabilidade conciliatória — geralmente aqueles que não envolvem grandes litigantes —, que se destine pessoal qualificado e estrutura eficiente para uma solução célere e eficaz. No modelo atual, ironicamente, quem deseja conciliar não encontra a estrutura ideal; já os que não desejam, especialmente os grandes litigantes, se beneficiam com a morosidade proporcionada por audiências inócuas.